quarta-feira, 1 de novembro de 2017

Borboletas imperiais

Temia não encontrar o fim da escada, mas ao mesmo tempo, voltar a ela parecia missão.
Rodopiando e rodopiando e rodopiando na névoa, girava no tempo, necessitando concluir o que não terminou.
Há um tempo teve a sensação de que caminhava pra trás. Mas ao retornar, sentiu uma leveza sem igual. 
Tinha sido feliz naquela paisagem e fez amigos e amores que o vento não derrubou.
Ele havia sido algo. Por muito tempo o sol. 
De todo o modo ela precisava retomar seu passado, era direito, e disso nem pensava em abrir mão. 
Mas na caixa de memórias o passado lhe mostrava tudo. Decidiu respeitar as contradições, reverenciar a alegria e aprender com o que não havia sido bom. 
Era possível apaixonar-se pelo passado. No entanto, ele já tinha ganhado o seu lugar. Adiante, tantas coisas se anunciavam... 
Casa, cama, colchão, luminária ao lado da cama; tudo pertinho de tudo, pra se poder tatear. 
Trabalho, colegas de trabalho, projetos, sorrisos, jovens cujas trajetórias estavam apenas a começar. 
Gentilezas. Carro para chegar ao trabalho, ver a paisagem ao longo da estrada, visitar a “irmãe” e o pai. 
Amigos redescobertos, sentidos, mãos que se estendiam ali. Quem sabe um novo amor? 
O coração acelerava. Batia forte pelas pequenas coisas. A beleza aparecia nas linhas de expressão, no corte das palavras ao emendar um assunto no outro, na lágrima caindo sem querer, nos fios grisalhos dos cabelos, no sorriso e no toque e em tudo o que não fosse óbvio demais. 
Parecia que o outubro seria pro resto da vida um mês endiabrado. 
Mas no outubro as flores surgiam, o cheiro do natal começava a dar seus primeiros sinais, e o brilho vivo do céu azul ia ficando mais penetrante. 
O sexo, rasgado, acelerado e forte, a deixava insegura. O que ele poderia revelar? 
Pareciam o lago e o alto mar. A brisa e o vento forte, a calmaria e a tempestade. O violino e a guitarra. Mas o abraço... e o braço e o suor escorrido no corpo e o olhar e o sorriso travesso e a vontade de mais produziam as borboletas imperiais. 
Então invadiam sentimentos mil. Saudade do algo recém-começado, medo de um futuro inesperado, de perder o controle, de sofrer. 
Tentava fugir da espiral da escada. Saía correndo, derrubava a parede de pedra buscando retornar à luz. 
E enfim, a caverna escura e fechada apontava sua saída antes entrada. Por trás, a estampa de um verde claro e vivo e um campo de girassóis.