segunda-feira, 29 de março de 2010

O gorro bordado

Estou triste, tremendamente triste, tão triste que chego a sufocar. Tenho medo de morrer , mas ao mesmo tempo, tenho vontade. Como será que é? Queria tanto acreditar que há um outro mundo... Talvez por isso as pessoas se apeguem tanto a Deus. Ele dá alento nessas horas em que a dor beira ao desespero.
Ela partiu. Dia 14 ela se foi. Ainda posso sentir o calor de suas mãos. Ainda posso vê-la sufocar...
Por agora uma saudade imensa. Não sei ao certo. Uma revolta por não ter ouvido dela aquele grito que eu gostaria de dar.
O que querem de mim? Ser esposa, dona-de-casa, mãe de família? Ser amante, secretária, motorista, um computador inteligente que antecipa os estímulos?
Ele não ouviu o meu grito de socorro. Terminou o almoço, levantou-se da mesa e foi trabalhar ou estudar ou trabalhar e estudar. E como a vida, tudo se desfaz. Já são seis horas da tarde e eu estou aqui, desfeita. Pelo menos vou ficar com o sorriso da velhinha, que carregava na cabeça um gorro igual ao daquela que se foi.
Mãe, hoje sonhei com você. Estavas de pé, na sala, a sala de nossa casinha no Estreito. Fazias tudo, tudinho. De trás da porta, por uma frestinha, eu consegui ver você, de vestidinho no joelho, deixando metade das pernas à mostra. É mãe, o tumor não estava mais ali. Só havia umas leves cicatrizes, sabe? Daquelas que não causam nem dor. Fiquei feliz por ti, porque agora, sem aquele tumor na perna, talvez você possa fazer novamente o que mais gosta. Para muitos, entrar numa igreja e rezar. Para mim, poder "bater perna" na cidade, longe de todos para quem não tens (tivestes) coragem de dizer não.
E de longe, a velhinha com o gorro bordado acenou e deu mais um sorriso.